Sobre não ser nem “eles”, nem “nós”
Vivemos dias difíceis para quem gosta de conversar sobre cenário político. A falácia do “eles contra nós” joga quem não são “eles” nem “nós” num limbo. Que bom!
Dizem que o brasileiro adora um clássico futebolístico. Atlético x Cruzeiro, Ferroviária x Botafogo-SP, Palmeiras x Corinthians. Os cariocas têm até uma expressão própria para isso, a “FlaFlu”. Quando alguém quer falar que há um contraponto forte entre dois lados, fala logo em “FlaFlu”. Lá no início do século XXI, alguém olhou para tal preferência brasileira e percebeu que isso podia virar algo positivo na política, podia criar um ambiente bom de se fazer valer do poder conseguido. Eu sei, o PT não inventou o “FlaFlu” político, em certa medida, ele existe, principalmente, no interior do país, onde candidatos fortes se contrapõe em toda eleição. No âmbito das metrópoles, os paulistanos hão de se lembrar do “Covas x Maluf”, apenas para exemplificar.
Retomando. Esse “FlaFlu” político foi levado para todas as discussões políticas e em tudo que envolvia o PT e as relações institucionais. Era sempre “eles x nós”. Acontece que “o jogo virou, não é mesmo?” Cansada de mostrar sua pluralidade, parte da oposição ao PT resolveu entrar na guerra e firma posição. A extrema direita assumiu a posição de “nós” na dicotomia e, numa ação bem elaborada de propaganda e análise do cenário político, chegaram ao poder.
Quem não é “eles” e nem “nós”, ficou no meio do caminho. Que bom. Estar no meio do caminho me dá a incômoda situação de ser chamado de petista pelos bollsonaristas e de fascista pelos lullistas. Tá tudo bem, não sou nem um, nem outro. Lullistas e Bollsonaristas são dois lados de uma mesma moeda, a saber, a do autoritarismo. Ambos querem poder acima de tudo, recusam-se ao diálogo, não querem saber de pluralidade política. A diversidade de opiniões incomoda, causa espécie. “Como assim você é a favor de privatização e do bolsa família?” Isso dá um nó nos neurônios lullistas e bollsonaristas e revela a incapacidade de lidar com a oposição. Tal qual o PT em 2002, o PSL está enfrentando uma onda de denúncias e investigações. A resposta do PSL é a mesma do PT: estamos sendo perseguidos pelos que estiveram no poder e estão com recalque de termos conquistado, nas urnas, o direito de estar aqui. Balela. Um democrata de fato jamais se colocaria numa posição de não poder ser questionado e criticado, pois a democracia é feita à partir do diálogo dos pontos divergentes. É por isso que Socialismo e Liberalismo não são totalmente bons e precisamos de um meio termo para que a sociedade caminhe.
Percebam que, até o momento, não entrei no mérito religioso e não pretendo fazê-lo no presente texto. Cristãos têm todo o direito de se posicionarem politicamente, desde que não coloque a ideologia política acima da ideologia cristã.
Diante da dicotomia burra do debate político, não seja mais um asno, saiba discernir, pensar e refletir além das posições extremadas. O extremismo nunca levou nenhuma sociedade ao progresso, só ao desmando desumano, quer das ditaduras de esquerda e direita, quer do mercado. Saiba que o debate democrático é necessário para o crescimento social, mas saiba também que a solução mais fácil no governo de um país cobra um preço muito alto, e quem paga a conta sempre são os mais pobres, que no Brasil representam 90% da população e você e eu estamos nela.
Para encerrar, pontuo aqui um dilema do qual eu venho me debatendo há alguns dias: é possível dialogar com extremistas? Nazistas, fascistas, maoístas, leninistas, extremistas de direita e esquerda merecem o esforço de se dialogar? Quando a chanceler alemã Angela Merkel vem a público e afirma que é preciso lutar rigorosamente contra a extrema direita, ela está sendo extremista ou está defendendo o direito democrático, que seria ameaçado pelos extremistas? Não sei, só sei que perdemos a oportunidade, nos últimos trinta anos, de ficarmos calados diante da minoria extremista que tínhamos no país, e hoje eles aprenderam a falar o que parte do povo gosta e isso ganhou força. O diálogo está cada vez mais difícil e cada dia mais eu encontro pessoas que se retiram dos círculos sociais quando se toda no assunto política.