Nas mãos de uma mulher

Giovanni Alecrim
6 min readNov 19, 2023

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Deus vocaciona mulheres fortes e sábias para promover a liberdade de seu povo

Recorte de imagem gerada a partir de Inteligência artificial

¹Depois da morte de Eúde, os israelitas voltaram a fazer o que era mau aos olhos do SENHOR. ²Por isso, o SENHOR os entregou nas mãos de Jabim, rei cananeu de Hazor. O comandante de seu exército era Sísera, que habitava em Harosete-Hagoim. ³Sísera, que tinha novecentos carros de guerra com rodas de ferro, oprimiu cruelmente os israelitas durante vinte anos. Então o povo pediu socorro ao SENHOR.

⁴Quem julgava Israel nessa época era Débora, uma profetisa, mulher de Lapidote. ⁵Ela costumava sentar-se debaixo da Palmeira de Débora, entre Ramá e Betel, na região montanhosa de Efraim, e os israelitas a procuravam para que ela julgasse suas questões. ⁶Certo dia, mandou chamar Baraque, filho de Abinoão, que morava em Quedes, no território de Naftali, e lhe disse: “O SENHOR, o Deus de Israel, lhe dá a seguinte ordem: ‘Convoque dez mil guerreiros das tribos de Naftali e Zebulom para irem ao monte Tabor. ⁷Eu farei Sísera, comandante do exército de Jabim, ir com seus carros de guerra e guerreiros até o rio Quisom. Ali eu os entregarei em suas mãos’”.

⁸Baraque disse a Débora: “Só irei se você for comigo; senão, não irei”.

⁹Débora respondeu: “Está bem, eu irei, mas você não receberá a honra nesta missão, pois o SENHOR entregará Sísera nas mãos de uma mulher”. Então Débora foi com Baraque a Quedes. (Juízes 4.1–9)

O relato bíblico dos juízes se entrelaça ao de Josué, embora pareça, por vezes ser consequência um do outro. Não temos como definir. Enquanto Josué narra uma conquista militar, Juízes narra a conquista gradativa da terra, com confrontos constantes.

Os juízes não eram governantes, tal como os reis da época. Havia uma relação de submissão à sabedoria e autoridade dos juízes, pois se entendiam que haviam sido levantados por Deus.

Há um coro que se repete em toda a narrativa de Juízes: “os israelitas voltaram a fazer o que era mau aos olhos do SENHOR”. O do nosso texto é a terceira repetição. Antes dele, Otoniel havia libertado o povo dos ataques de Cusã-Risataim; Eúde havia libertado o povo dos domínios da opressão de Moabe.

Entre Eúde e Débora, Juízes faz menção a Sangar, mas não diz o povo que ele venceu para libertar Israel, nem menciona o coro citado anteriormente. Temos, então, mais uma vez o coro e agora o protagonismo de Débora.

A noroeste do Mar Morto, nas montanhas entre Ramá e Betel, à sombra de uma palmeira está assentada Débora. Pouco sabemos de sua origem, apenas que foi esposa de Lapidote — de quem o texto não diz mais nada em lugar nenhum — e juíza em Israel.

Ali está Débora, assentada, julgando as questões do povo. Brigas de vizinhos, dívidas, problemas dos mais diversos chegavam a ela diariamente.

Dentre as reclamações, uma era constante e se destacava nos últimos anos: Jabim, rei de Hazor, localizada ao norte de Naftali, atacava constantemente Israel, liderados por Sísera, comandante do exército de Jabim.

O povo, que mais uma vez havia se desviado dos caminhos de Javé, recorda de seu Deus, e clama. A opressão não era pouca. O texto nos revela que o exército sob comando de Sísera possuía novecentos carros de guerra com rodas de ferro. Sabe o que isso significa? Primeiro, que Israel não tinha carros de guerra com rodas de ferro; segundo que Jabim era um rei poderoso o suficiente para manejar o ferro e armar seus carros.

Sensível ao clamor, Débora manda chamar Baraque, da tribo de Naftali. Baraque era líder, guerreiro, militar de destaque de sua tribo. Chamado por Débora, a juíza, comparece diante dela para ouvir a palavra que o Senhor lhe havia revelado: Javé entregaria Sísera, comandante do exército de Jabim, nas mãos de Baraque.

Para um líder, guerreiro e militar de destaque de sua tribo, Baraque se sentiu intimidado demais diante de Débora, a ponto de não acatar a palavra e impor uma condição: se a palavra é de Javé, então Débora iria como ele.

Débora deixa claro que, pela insegurança de Baraque, não seria ele lembrado pela morte de Sísera, mas sim uma mulher. E partem ao norte, em direção a Quedes.

O povo convocado por Baraque se reuniu no monte Tabor e o exército de Sísera se posicionou para atravessar o Rio Quisom. Neste momento Javé criou confusão no exército de Sísera. Muito provável que as águas subiram repentinamente impedindo o avanço do exército, fazendo com que Baraque e seus homens vencessem.

E Sísera? Fugiu para a tenda de Jael. Jael era esposa de Héber, o queneu. Héber era cunhado de Moisés, habitava próximo à região. Ao chegar ali, Sísera fora acolhido por Jael, que o levou para se deitar, serviu-lhe leite e o cobriu com uma manta.

Sísera pede que Jael fique do lado de fora e não diga a ninguém que está ali. Vendo que Sísera dormia profundamente, Jael toma uma estaca de tenda e um martelo e atravessa o crânio de Sísera, matando-o.

Quando Baraque, a procura de Sísera, se aproxima da tenda de Jael, pergunta pelo comandante de Jabim. Ela o conduz para dentro da tenda e lhe mostra Sísera com a estaca fincada no crânio.

Daquele dia em diante o povo se fortaleceu e combateu Jabim até derrotá-lo definitivamente.

Deste relato impressionante do capítulo quatro de Juízes destaco alguns ensinamentos.

Mulheres são líderes vocacionadas por Deus

Há quem pense que não. Aliás, é comum encontrar em nosso meio pessoas que afirmem categoricamente que não. Desconhecem a Bíblia e a história do povo de Deus.

Na nossa história encontramos duas mulheres vocacionadas em diferentes frentes.

Débora, uma sábia mulher que ouve a voz de Deus e julga as causas do cotidiano do povo. Ela ouve e não retém para si, mas proclama a vontade de Deus, quer nas causas menores e simples, quer numa opressão como a enfrentada pelo povo de Israel nas mãos de Jabim e Sísera.

Jael, uma mulher forte e sagaz, que vê diante de si um homem fugindo, que vivia em paz com sua gente, mas que oprimia o povo ao seu redor. Sensível à dor e sofrimento dos israelitas, ela age como uma guerreira e mata Sísera.

Duas mulheres que são retratos de seu tempo. Líderes, fortes, sábias e usadas por Deus para abençoar o seu povo. É da ação delas que destaco outro ensinamento.

Opressões tem prazo de validade

O livro de Juízes é enfático em destacar que as opressões iam e voltavam sobre Israel. O povo sofria por sua desobediência, por sua falta de memória e fidelidade a Deus.

As opressões caíam sobre o povo e eles sofriam. Reis que assaltavam vilas, plantações, destruindo e causando medo por onde passavam.

A mão de Deus nunca esteve ausente, sempre presente com seu povo. Didaticamente, Juízes ensina para o povo que a obediência é o caminho exigido no Antigo Testamento.

Dentro do contexto do Antigo Testamento, Juízes mostra que a grande tragédia nacional, com o exílio, séculos mais tarde, tem sua raiz numa atitude repetida seguidamente pelo povo e, posteriormente, pelos reis de Israel.

No fim de toda essa jornada, para nós, cristãos, está a cruz. A cruz vazia, a tumba vazia. Ao ressuscitar, Jesus vence todas as opressões, nos garantindo liberdade. Pela obediência de um, a salvação de todos. Graça de Deus sobre nós!

Conclusão

O relato da jornada de Débora, com participação de Jael, nos revela como Deus agiu na história para preservar seu povo ante a opressão.

A lição para nós é clara: mulheres são, tanto quanto os homens, instrumentos de Deus para a liberdade de seu povo. O recuo e temor de Baraque abre caminho na história para mostrar o protagonismo feminino no texto do Antigo Testamento.

É com o protagonismo de Débora e Jael que o povo é liberto. Chega ao fim vinte anos de opressão do rei Jabim. As tribos do extremo norte de Israel encontram paz por um longo período.

Toda opressão que enfrentamos hoje, seja de que natureza for, já teve seu fim decretado na cruz. Ao vencer a morte, Jesus nos libertou para que tenhamos vida.

Quando você passar por momentos difíceis, lembre-se que todo sofrimento é “por enquanto” e que a liberdade que Cristo nos dá nos permite enfrentar toda e qualquer opressão, sendo nós mesmos os instrumentos nas mãos de Deus. Sigamos debaixo da Graça de Deus, todo mundo junto, sem ninguém ficar de fora.

Sermão pregado em 18 de novembro de 2023 na Igreja Presbiteriana Independente de Tucuruvi, São Paulo, SP

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