Do direito à morte
Não escolhemos nascer, podemos escolher morrer?
Em 2010 a suíça Michele Causse decidiu acabar com sua vida. Ela sofria de uma doença óssea não letal e, não desejando mais viver, decidiu morrer. Para tal, ela recorreu a uma das duas organizações no país que prestam o serviço do suicídio assistido. Tal prática não acontece facilmente, há uma série de protocolos e entrevistas a cumprir antes de receber o veneno que dará fim à própria vida. O caso de Michele foi acompanhado e transmitido na televisão suíça e você pode assistir o conteúdo, legendado, aqui:
Não há um versículo na Bíblia que condene, explicitamente, o suicídio. Ao tratar do assunto, os estudiosos associam o mandamento “Não matarás” ao suicídio e as palavras de Jesus acerca da blasfêmia contra o Espírito Santo como pecado imperdoável, daí se faz um exercício de interpretação que carece de embasamento para dizer que se matar é uma blasfêmia contra o Espírito Santo. A Bíblia registra os seguintes casos de suicídio: Abimeleque (Juízes 9.54); Sansão (Juízes 16.29–31); Saul e o escudeiro (1 Samuel 31.3–6); Aitofel (2 Samuel 17.23); Zinri (1 Reis 16:18) e Judas (Mateus 27.5). Em todos estes exemplos o suicídio foi desencadeado por uma série de fatores que levaram a uma atitude extremada. No caso de Michele, não, ela estava serena e brincalhona no momento de sua morte. Ela decidiu morrer.
Eu assisti ao vídeo diversas vezes e, ao final, eu ficava com a sensação de que não há muito o que pensar a respeito. Do ponto de vista cristão a morte só acontece segundo os desígnios de Deus. Jó, em meio ao sofrimento da perda de sua família, afirma:
“Saí nu do ventre de minha mãe, e estarei nu quando partir. O Senhor me deu o que eu tinha, e o Senhor o tomou. Louvado seja o nome do Senhor!”. Jó 1.21
É Deus quem dá a vida, portanto, na concepção cristã, só Deus pode tirá-la. Quando vejo o que Michele decidiu fazer, e a forma como ela o fez, eu me vejo pensando se ela não estaria tomando para si um direito que pertence a Deus. No entanto, não consigo parar aqui o pensamento, pois, se o pecado causou separação entre Deus e o ser humano, ele acabou legando à humanidade um senso de autoridade máxima sobre si mesmo, como senhor e senhora de si. Ser cristão é reconhecer que o senhorio sobre nossas vidas não é nosso, pertence a Cristo. Não posso concordar com o que ela fez e nem com a existência de tal serviço, mas minha concordância ou não, não mudará o fato de que ele existe e que pessoas se fazem valer dele. Por mais que se queira passar uma imagem positiva do suicídio, ainda penso que há em cada ser humano um elemento essencial, que é o desejo de viver, e se ele deixa de existir, não importa se você dá cabo de sua vida de maneira extremada ou com serenidade e com humor, no meu entender, em ambos os casos, há uma enfermidade na alma que precisa ser curada. Suicidas são pessoas enfermas, elas precisam de tratamento, de cura, elas precisam de Cristo.